AR revoga descida da TSU para os patrões

Aumento do SMN<br>não é moeda de troca

O Parlamento revogou o diploma do Governo que reduz a TSU para as empresas. Corrigida é assim uma «medida errada prejudicial», ficando a ganhar os trabalhadores e a justiça social.

Com a revogação da TSU ganham os trabalhadores e a justiça social

LUSA

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A favor do chumbo do decreto-lei estiveram o PCP, o BE (partidos que, aliás, solicitaram a apreciação parlamentar do texto governamental), o PEV, e também o PSD, este por razões bem distintas e que só podem interpretadas como acto eivado do mais puro tacticismo, ainda que ocasionalmente tal opção possa coincidir com os interesses dos trabalhadores e ser útil a estes. CDS-PP e PAN abstiveram-se e o PS foi o único a votar pela sobrevivência do diploma.

Em causa estava a baixa da TSU paga pelas entidades patronais em 1,25 ponto percentuais, medida aprovada em sede de concertação social entre o Governo e os restantes parceiros, excepção feita à CGTP-IN que dela discordou e, por essa razão, entre outras, não subscreveu o chamado «acordo».

Do debate, e comprovando a justeza das razões aduzidas para os pedidos de apreciação parlamentar ao diploma, bem se pode dizer que deu um contributo decisivo para aclarar de vez – desmitificando uma ideia que há muito vem sendo trabalhada por sucessivos governos e patronato, com a ajuda da UGT – que não é a concertação social que decide sobre a legislação laboral mas sim o Governo e a Assembleia da República que detêm competência para tomar decisões sobre a matéria.

E por isso este debate, como sublinhou no final o presidente da formação comunista, João Oliveira, representou uma «séria machadada na estratégia de quem tem utilizado o veto das confederações patronais na concertação social como travão a medidas favoráveis aos trabalhadores».

Ganha a justiça social

Sem nunca perder de vista a existência de outras medidas negativas que em sua opinião estão presentes no acordo de concertação social – e este é outro ponto que importa destacar do debate –, a bancada comunista não deixou de valorizar com grande ênfase esta revogação da TSU por considerar que deste acto parlamentar beneficiam os trabalhadores e a justiça social.

A deputada comunista Rita Rato, no arranque do debate, explicara já por que razão era tão necessário derrotar aquela medida errada, salientando, nomeadamente, que se trata de um «estímulo à política de baixos salários» e significa pôr os trabalhadores a pagar o próprio aumento do SMN por via da Segurança Social e do Orçamento do Estado.

E ao contrário do que sustentou o ministro do Trabalho, Vieira da Silva, dizendo que a redução da TSU beneficiaria em larga medida as micro, pequenas e médias empresas, quem dela tiraria partido em larga escala seriam os «grandes grupos económicos que usam e abusam do SMN», como insistentemente afirmou a bancada comunista.

Do debate que se prolongou por cerca de duas horas e meia resultou igualmente clara a rejeição absoluta da parte do PCP a qualquer medida que funcione como compensação ou moeda de troca pelo aumento do SMN (ver caixa).

«O aumento do SMN é uma exigência de dignidade e não deve ter contrapartidas para além do trabalho prestado por cada trabalhador», sublinhou Rita Rato, que lembrou que este trabalho «é mais do que suficiente para justificar muito mais do que o salário mínimo», e que mesmo que o «aumento seja maior, a cada trabalhador continua a ser extraída uma parte do seu trabalho, que reverte para o capital».

O oportunismo do PSD

Num debate onde o PSD acabou enleado nas suas contradições e incoerências – «à falta do Diabo que nunca mais chega, o PSD resolveu vestir-lhe a pele e mudar de posição em relação à TSU», anotou João Oliveira –, o que acabou por emergir desse oportunismo foi a confirmação de que o verdadeiro objectivo por si visado era atacar o aumento do SMN.

Isso ficou de resto bem patente quando, num aparte à intervenção do titular da pasta do Trabalho, Passos Coelho deixou escapar – fugindo-lhe a boca para a verdade – que o aumento do SMN é «excessivo».

«Os objectivos do PSD com esta troca de casaca na TSU eram o de atacar o aumento do SMN e o de criar dificuldades à solução política que os afastou do governo e que tem permitido aos trabalhadores verem repostos alguns dos seus direitos que lhes foram cortados pelo anterior governo», afirmou o presidente da bancada comunista, que não estranhou esta postura vinda de quem, recordou, enquanto esteve com responsabilidades governativas «cortou salários e queria que os cortes fossem definitivos, impôs uma marcha forçada de empobrecimento e hoje faz tudo para que esse caminho seja retomado».

 A coerência do PCP

João Oliveira rejeitou por fim a ideia de «crise política» ventilada pelas bancadas à direita e por observadores, admitindo que tal fantasia «só existe na cabeça de quem alimenta a ficção criada pelo PSD de que há em Portugal uma coligação em que alguns partidos tenham de andar pela arreata a aceitar posições com as quais não estão de acordo, como acontecia com o CDS-PP no anterior governo e na coligação PAF [Portugal à Frente, PSD-CDS-PP]».

Daí ter concluído que se enganou duplamente quem assim pensa, porquanto, primeiro, o «PCP não faz como o PSD e não prescinde da sua coerência», segundo, «porque não existe nenhuma coligação». Mais, insistindo que as posições do PCP «são claras e coerentes», e que não aceita «moeda de troca nem contrapartidas pelo aumento do SMN», João Oliveira deixou ainda uma certeza: o PCP «não será levado pela arreata» e as «divergências de posições» com o PS só significarão da sua parte «mais iniciativa e acção» em favor dos trabalhadores e do povo.

Empobrecer a trabalhar

Reafirmada no debate pelo PCP foi a não aceitação de qualquer moeda de troca (como a descida da TSU) para o patronato pelo aumento do SMN. Entende a bancada comunista que tem de haver separação de águas e que é inaceitável qualquer cedência à chantagem do patronato que exige contrapartidas para o aumento do SMN.

Os baixos salários e em particular o valor do salário mínimo nacional continua a ser uma «causa estrutural de pobreza», como aliás atesta o facto de quase um terço das pessoas em situação de pobreza serem trabalhadores.

E não pode ignorar-se que desde a sua criação, com a Revolução do 25 de Abril, o salário mínimo nacional sofreu uma profunda desvalorização (agravado com o seu congelamento entre 2011 e 2014), encontrando-se muito aquém do valor correcto em que era suposto estar se tivesse sido alvo de actualização de acordo com a inflação e o aumento da produtividade entretanto verificado.

Foi por isso que sem deixar de valorizar o aumento do SMN para os 557 euros, a deputada Rita Rato não deixou de chamar a atenção para o carácter «claramente insuficiente» do mesmo, sublinhando que não permite recuperar o poder de compra nem combater a pobreza.

E realçou que o nosso País mantém um dos mais baixos salários mínimos da Europa, mesmo tendo em conta a retribuição a 14 meses, correndo-se o risco de esse fosso ser ainda maior, nomeadamente em relação à vizinha Espanha.

Daí que o aumento do SMN, na perspectiva do PCP – que reiterou no debate o seu empenho na batalha pelo aumento para 600 euros –, seja uma exigência nacional por razões de justiça social e de maior equidade da distribuição da riqueza, mas também por razões económicas, pelo aumento do poder de compra e consequente dinamização do mercado interno.

Quanto às linhas que podem justificar-se de estímulo às micro, pequenas e médias empresas, como é por exemplo a redução e eliminação do Pagamento Especial por Conta (PEC) ou a baixa dos custos de energia – medidas, aliás, já propostas pelo PCP –, essas têm a sua «ponderação e justificação própria e não podem ser consideradas como contrapartidas pelo aumento dos salários», esclareceu Rita Rato.

Luta que não pára

Aspecto central que perpassou o debate e dele emana como importante linha de acção – e João Oliveira relevou-o no apuramento final que fez – prende-se com a necessidade de que sejam respeitados e tidos em conta os interesses dos trabalhadores sempre que estejam em equação opções relacionadas com a política laboral.

Daí que tenha ficado claro que PCP não abdica de prosseguir a batalha pela reversão das malfeitorias do anterior governo PSD/CDS-PP, pela revogação das normas mais gravosas da legislação laboral, pela reposição de direitos que foram cortados, nomeadamente defendendo a contratação colectiva.

Esse é, pois, um debate que a bancada comunista saberá manter vivo e continuará a levar à AR, afiançou o seu líder, que garantiu não esquecer de igual modo outros aspectos negativos inscritos no acordo de concertação social.




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